Nº 66 | OTOÑO 2024

ISSN: 1139-1979 | E-ISSN: 1988-5733 © 2024. E. Universidad de Sevilla.

CC BY-NC-SA 4.0

10.12795/Ambitos.2024.i66.04

pp. 72-87


WhatsApp no jornalismo regional: um estudo a partir da percepção dos jornalistas de Palmas (TO)[1]

WhatsApp in regional journalism: a study based on the perception of journalists from Palmas (TO)

Fernanda Alves de Mendonça

Universidade Federal do Tocantins – Câmpus de Palmas | Quadra 109 Norte, Av. NS-15, ALCNO-14. Plano Diretor Norte. CEP: 77001-090. Palmas – TO.

0009-0008-6104-8397 | fernandauft@gmail.com

Thays Assunção Reis

Universidade Federal do Tocantins – Câmpus de Palmas | Quadra 109 Norte, Av. NS-15, ALCNO-14. Plano Diretor Norte. CEP: 77001-090. Palmas – TO.

0000-0001-6826-1096 | thays.jornalista@gmail.com

Recepción 16/05/2024 · Aceptación 06/07/2024 · Publicación 15/10/2024


Resumo

Este artigo tem como objetivo entender como os jornalistas que atuam em veículos tradicionais da cidade de Palmas, capital do Tocantins (Brasil), utilizam o aplicativo WhatsApp para desenvolver uma cobertura jornalística regional. Para alcançar este propósito foram realizadas entrevistas semiestruturadas com dez jornalistas –sendo sete da TV Anhanguera (afiliada à Rede Globo) e três da rádio CBN Tocantins –entre os meses de julho e setembro de 2023. O aporte teórico do estudo traz considerações sobre o jornalismo regional e a presença do WhatsApp nas redações brasileiras. Os resultados desta pesquisa mostram que o WhatsApp contribui de forma significativa para a produção de conteúdo diário sobre as cidades próximas e distantes das sedes das redações sem a necessidade de deslocamento das equipes. Por outro lado, observou-se, a partir das entrevistas, que o aplicativo sobrecarrega a rotina de trabalho dos jornalistas, pois eles têm de participar de um grande volume de grupos sobre notícias de outros municípios, para captar e apurar informações regionais em circulação. Em termos de conteúdo, as notícias regionais produzidas via aplicativo se mostram cada vez mais desprovidas das percepções dos jornalistas, em razão dessa falta de apuração presencial; distantes dos lugares nos quais acontecem esses fatos; e afastado das pessoas de onde se fala.

Palavras-chave: WhatsApp, notícias regionais, jornalismo, Tocantins.

Abstract

This article aims to understand how journalists working for traditional media outlets in the city of Palmas, the capital of Tocantins1 (Brazil), use the WhatsApp application to develop regional news coverage. To achieve this, semi-structured interviews were conducted with ten journalists - seven from TV Anhanguera (affiliated to Rede Globo) and three from CBN Tocantins radio - between July and September 2023. The study’s theoretical framework includes considerations about regional journalism and the presence of WhatsApp in Brazilian newsrooms. The results of this research show that WhatsApp contributes significantly to the production of daily content about cities near and far from newsroom headquarters without the need for teams to travel. On the other hand, it was observed from the interviews that the app overloads journalists’ work routines, as they have to participate in a large number of news groups from other municipalities in order to capture and compile regional information in circulation. In terms of content, the regional news produced via the app is increasingly devoid of journalists’ perceptions, due to this lack of face-to-face investigation; distant from the places where these events take place; and far removed from the people they are talking about.

Keywords: WhatsApp, local news, journalism, Tocantins.


1. Introdução

As convergências tecnológicas e midiáticas transformaram a produção de notícias, há mais de uma década, quando as empresas jornalísticas passaram a seguir uma lógica produtiva integrada, com profissionais “multitarefas”, fluxo de conteúdo em múltiplas plataformas e adoção de diferentes linguagens nas narrativas (Salaverría & Negredo, 2008; Jenkins, 2009). Desde então, diversas ferramentas tecnológicas surgiram e foram inseridas neste ambiente para contribuir com o novo ritmo de trabalho nas redações. Uma delas foi o WhatsApp - aplicativo de mensagens lançado em 2009 pelo norte-americano Jan Koum e pelo ucraniano Brian Acton como alternativa ao uso do sistema SMS (Short Message Service), serviço de envio de mensagens curtas de texto entre celulares.

O WhatsApp passou a ser adotado nas redações de veículos da imprensa em todo o mundo a partir de 2014[2], em projetos especiais. Consolidando-se como um eficaz canal de distribuição de conteúdo por meio de listas de transmissão ou boletins informativos; e canal de engajamento com o público, ao obter feedback, sourcing e construir uma base de usuários leais por meio de comunicação pessoal (Boczek & Koppersb, 2020).

Do ponto de vista do jornalismo regional brasileiro, o WhatsApp mostra-se uma ferramenta valiosa para acompanhar os acontecimentos em diversas cidades, desde as mais próximas geograficamente, até as distantes das sedes dos veículos jornalísticos. Devido a isso, o objetivo deste artigo é verificar como os jornalistas que atuam nas redações de Palmas, capital do Tocantins (Brasil), utilizam o WhatsApp para desenvolver uma cobertura regional. Para dar conta dessa proposição, realizou-se entrevistas semiestruturadas com dez jornalistas de dois principais veículos de comunicação da cidade - sete da TV Anhanguera e três da CBN Tocantins, entre os meses de julho a setembro de 2023. Esta pesquisa optou por não adotar uma hipótese para verificar o fenômeno investigado.

O estudo se justifica por investigar um assunto inexplorado no contexto brasileiro, que é a utilização do WhatsApp nas redações para a produção noticiosa regional. Nas teses e dissertações defendidas no país nos últimos 14 anos (2009-2023)[3], identificou-se apenas trabalhos sobre os usos do WhatsApp na rotina de trabalho dos jornalistas, mas nenhum voltado ao assunto aqui sugerido. Desse modo, este estudo mostra-se necessário e relevante por avançar nas discussões científicas em torno do fazer jornalístico regional no Brasil.

Isto posto, este texto segue dividido em cinco seções: esta introdução; a apresentação do jornalismo regional e o contexto brasileiro do WhatsApp; a descrição da metodologia, com informações dos entrevistados, critérios de seleção e instrumentos, as análises das entrevistas, e, por fim, as considerações.

2. Jornalismo regional e WhatsApp no cenário brasileiro

Os meios de comunicação regionais e seu jornalismo são vistos como elementos fundamentais para as comunidades fora dos grandes centros urbanos. Jerónimo e Esparza (2023) explicam que os meios de comunicação regionais influenciam a “agenda pública das pequenas comunidades, facilitam o conhecimento dos cidadãos sobre os seus líderes e as diferentes políticas e posições e colaboram na tarefa necessária de responsabilização desses representantes públicos” (p. 2).

No contexto brasileiro, os meios regionais são os responsáveis pela cobertura dos fatos mais próximos, aqueles que acontecem em uma microrregião, mesorregião, em um Estado ou uma macrorregião, e interferem diretamente na vida cotidiana dos moradores que ali residem (Aguiar, 2016). Por esse motivo, seu jornalismo é, frequentemente, caracterizado pela proximidade geográfica com o público, as fontes e os fatos noticiados; a identidade sociocultural e histórica com os territórios e sociedades dos quais emergem ou nos quais estão inseridos (Aguiar, 2016); e a produção da chamada “informação de proximidade”, que compreende, conforme descrito por Peruzzo (2005):

aquela que expressa as especificidades de uma dada localidade, que retrata, portanto, os acontecimentos orgânicos a uma determinada região e é capaz de ouvir e externar os diferentes pontos cidadãos, das organizações e dos diferentes segmentos sociais. (p. 81).

De outra forma, o jornalismo regional no Brasil pode ser visto como uma prática que extrapola os limites territoriais das sedes dos veículos e produz informação sobre outras cidades (Reis, 2018). Nas cidades médias não metropolitanas[4], como descrito por Reis (2018), ele ganha contornos ainda mais específicos, assumindo a condição de “jornalismo de influência regional, que orienta a produção e o consumo de informação de proximidade na região na qual está inserido, e, ao mesmo tempo, faz a intermediação dos fluxos informativos nacionais e internacionais” (p. 98).

Corroborando com esta definição, Deolindo (2013), afirma que os veículos regionais preenchem a lacuna de informação deixada pela prática jornalística nacional e estadual referente à multiplicidade de acontecimentos que ocorrem no país. Deolindo (2013) observou que os jornais regionais e locais, junto com os portais de notícias regionais, “publicam notícias de interesse direto e próximo da comunidade, ao mesmo tempo em que reproduzem informações dos grandes centros para manter o público informado do que se passa [lá fora]” (p. 7-8).

Dito isto, o jornalismo regional sempre contou com o auxílio de recursos tecnológicos, como telégrafos e telefones, para conseguir dar conta dos acontecimentos de outras localidades. Entre eles, o WhatsApp é o mais recente e significativo nos veículos regionais brasileiros. Ele começou a ser utilizado no país pelo jornal Extra, do Rio de Janeiro. O impresso adotou a ferramenta em 2013, de forma espontânea e sem um plano de atuação, apenas a partir da iniciativa do editor digital Fábio Gusmão, ao observar o enraizamento do aplicativo na vida das pessoas. O objetivo inicial era conseguir informações das pessoas, principalmente fotografias e vídeos, sobre as manifestações nacionais de junho de 2013, motivadas pelo aumento da tarifa de ônibus na cidade de Porto Alegre (RS), e que mobilizou milhares de pessoas a se posicionarem contrárias à corrupção, governos e políticos (Specht, 2019).

Nos anos seguintes, o WhatsApp foi sendo inserido progressivamente nas redações de veículos jornalísticos de todo país. Em 2016, o aplicativo foi localizado por Reino e Bueno (2017) em 27 veículos mais acessados de cada capital do país e nos três maiores jornais de circulação nacional. Segundo os autores, naquele período o aplicativo era o mais comum dentro das redações, mas era usado sem nenhum tipo de orientação, apenas como ferramenta para envio de sugestões de pauta (Reino & Bueno, 2017).

Em 2023, durante o levantamento de pesquisas sobre o uso do WhatsApp por veículos jornalísticos no Banco da Capes[5] e na Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD)[6] entre os anos de 2009 e 2023, registrou-se 26 veículos de diferentes regiões do Brasil que adotaram o aplicativo na sua rotina produtiva (Quadro 1). O dado, além de evidenciar a presença da ferramenta nas redações, revela o interesse da academia pelo tema.

Quadro 1

Levantamento do WhatsApp nas redações brasileiras (2009-2023)

Veículo de comunicação

Tipo

Cidade/Estado

Correio Braziliense

Site

Brasilia (DF)

GI Distrito Federal

Site

Brasilia (DF)

Metrópoles

Site

Brasilia (DF)

TV Centro América

Televisilo

CampoGrande(MT)

Rádio O Povo CBN

Rádio

Fortaleza(CE)

Extra

Site

Riode Janeiro(RJ)

Diário Gaúcho

Site

PortoAlegre(RJ)

TVTribuna

Televisilo

Vitória(ES)

MS Record - TV MS

Televisilo

CampoGrande(MS)

Campo Grande News

Site

CampoGrande(MS)

Correio do Estado

Site

CampoGrande(MS)

Midiamax News

Site

CampoGrande(MS)

TVGlobo Rio

Televisilo

Riode Janeiro(RJ)

TV Borborema

Televisilo

CampinaGrande(PB)

TV Paraíba

Televisilo

CampinaGrande(PB)

TV Irararé

Televisilo

CampinaGrande(PB)

TV Sorocaba

Televisilo

Sorocaba(SP)

Meio Norte

RádioJornal

Teresina(PI)

O Globo

Site e impresso

Silo Paulo(SP)

O Dia

Site e impresso

Silo Paulo (SP)

O Estado de S. Paulo

Site e impresso

SiloPaulo(SP)

Folha de S. Paulo

Site e impresso

SiloPaulo(SP)

Grupo ND

Televisilo

Joinville(SC)

TV Paraíba

Televisilo

Paraíba (JP)

Sistema Jornal do Commercio de Comunica iio

Grupo de Comunica ilo

Recife (PE)

CBN Joilo Pessoa

Rádio Jornal

JoiloPessoa(PB)

Fonte. Elaborado pelas autoras com base no banco da Capes e BDTD (2024).

Os dados apresentados acima demonstram ainda a trajetória geográfica da introdução do WhatsApp nas redações, que se inicia nas metrópoles e capitais estaduais, e avança para as cidades médias situadas no interior dos estados. Trata-se de uma tendência comum no território brasileiro, onde o perímetro urbano dos grandes centros sempre foram pioneiros nas manifestações comunicacionais que terminam por influenciar o país por inteiro nas formas de produção, gestão e apresentação (Fadul & Moreira, 2019).

3. Metodologia

Para o desenvolvimento desta pesquisa adotou-se uma abordagem qualitativa, com o emprego de entrevistas semiestruturadas (Duarte, 2005). Foram entrevistados dez profissionais - sete da TV Anhanguera (afiliada à Rede Globo) e três da CBN Tocantins (Quadro 2) entre os dias 6 de julho e 12 de setembro de 2023. Para a seleção dos entrevistados, nos dois veículos, utilizou-se como critérios de inclusão e exclusão: formação em jornalismo e função. Descartou-se os profissionais que atuavam como jornalistas, mas que não concluíram o curso de graduação, e dentro do filtro da função, considerou-se os com cargo de comando. No caso específico dos repórteres da TV, entrevistou-se um com mais tempo de casa e outro com menos tempo. O objetivo foi captar as informações sobre a utilização do WhatsApp dentro da redação em um período mais extenso e também o contrário dessa prática.

Quadro 2

Jornalistas da TV Anhanguera e CBN Tocantins entrevistados

Nome

Função

Veículo

Formação

Noira Botelho

Chefe de produção

Tv Anhanguera

Jornalismo

Igor Pires

Chefe de produção

Tv Anhanguera

Jornalismo

Jocyelma Santana

Editora-chefe e âncora

Tv Anhanguera

Jornalismo

Ana Paula Rehbain

Repórter com mais tempo de casa

Tv Anhanguera

Jornalismo

Kaliton Mota

Repórter com menos tempo de casa

Tv Anhanguera

Jornalismo

Nayna Peres

Produtora

Tv Anhanguera

Jornalismo

Luciane Marchesini

Produtora

Tv Anhanguera

Jornalismo

France Santiago

Coordenadora e âncora

CBN Tocantins

Jornalismo

Ana Gabriella Regis

Repórter

CBN Tocantins

Jornalismo

José Uendel Souza

Produtor e repórter

CBN Tocantins

Jornalismo

Fonte. Elaborado pelas autoras.

As entrevistas[7] foram conduzidas a partir de um roteiro com 17 perguntas para cargos de chefia/comando das emissoras (Quadro 3), e 15 perguntas para repórteres e produtores da CBN Tocantins e TV Anhanguera (Quadro 4). As questões compreenderam as opiniões dos jornalistas sobre o conceito de jornalismo regional, como é realizada a produção de notícias regionais, papel do WhatsApp nesse processo, cidades do interior mais pautadas, como acontece a seleção das informações que chegam pelo aplicativo, e os prós e contras desta usabilidade.

Após os encontros com os profissionais, as gravações das entrevistas foram transcritas pelo próprio WhatsApp, com o bot Viratexto, que capta e transcreve áudios. Para isso foi necessário salvar o número de telefone +55 (31) 97228-0540 na agenda do celular e iniciar a conversa pelo WhatsApp e enviando cada áudio desejado. Como o programa só transfere áudios de até 4 minutos, foi necessário transcrever manualmente os que ultrapassaram o tempo, além da revisão completa de todas as transcrições feitas pelo bot, pois não reconheceu algumas palavras.

Com base nas respostas dos entrevistados, organizou-se a análise das informações em quatro eixos temáticos: a) definição e prática do jornalismo regional; b) WhatsApp na produção de notícias regionais e a relação com as cidades do interior; c) inserção do WhatsApp na rotina de trabalho; e d) as vantagens e desvantagens do uso do aplicativo pelos jornalistas.

Quadro 3

Roteiro de perguntas para cargos de chefia/comando da TV Anhanguera e CBN Tocantins

O que você entende por jornalismo regional? Você pode conceituar?

Você considera que a empresa possui uma produção regional? Por quê?

Como é realizada a produção de notícias regionais? Há deslocamento de jornalista e/ou equipe para outras cidades do interior?

Qual o papel do WhatsApp na produção regional? Você acha que o aplicativo facilitou esse tipo de cobertura?

De que modo vocês mais recebem sugestões de pauta de outras cidades no WhatsApp (p.ex. sugestão dos telespectadores, das assessorias, de grupos dos municípios, de comunicadores/jornalistas do interior, etc)?

Como são selecionados os acontecimentos/demandas de outras cidades que chegam pelo WhatsApp para entrar no telejornal? Quais os critérios de inclusão e exclusão.

Como faz a verificação das informações de outras cidades que chegam pelo WhatsApp?

Você está em grupos de WhatsApp de outras cidades? Quais?

Esses grupos de WhatsApp de outras cidades ajudam na obtenção de informação na rotina?

Quais cidades são mais pautadas pela empresa? E por que isso ocorre?

Existem dificuldades para a realização de uma cobertura regional? Se sim, quais são elas?

Quando passou a utilizar o WhatsApp como ferramenta de trabalho?

Como ocorreu o processo de inserção do WhatsApp na sua rotina de trabalho?

Qual é a dinâmica de troca de mensagens entre os jornalistas e as fontes por meio do número institucional? Vocês passam algum tipo de orientação para os profissionais? Se sim, quais?

Quais as vantagens e desvantagens do uso do WhatsApp no processo de produção da notícia?

Em sua atuação ocupando cargo de chefia, você incentiva o uso do WhatsApp pelos jornalistas?

Quando os grupos de trabalho foram criados? A pandemia teve alguma influência?

Fonte. Elaborado pelas autoras.

Quadro 4

Roteiro de perguntas para repórter e produtor da CBN Tocantins e TV Anhanguera

O que você entende por jornalismo regional? Você pode conceituar?

Você considera que a empresa possui uma produção regional? Por quê?

Como é realizada a produção de notícias regionais? Há deslocamento de jornalista e/ou equipe para outras cidades do interior?

Qual o papel do WhatsApp na produção regional? Você acha que o aplicativo facilitou esse tipo de cobertura?

De que modo vocês mais recebem sugestões de pauta de outras cidades no WhatsApp (p.ex. sugestão dos telespectadores, das assessorias, de grupos dos municípios, de comunicadores/jornalistas do interior, etc)?

Como são selecionados os acontecimentos/demandas de outras cidades que chegam pelo WhatsApp para entrar no telejornal/rádio jornal? Quais os critérios de inclusão e exclusão.

Como faz a verificação das informações de outras cidades que chegam pelo WhatsApp?

Você está em grupos de WhatsApp de outras cidades? Quais?

Esses grupos de WhatsApp de outras cidades ajudam na obtenção de informação na rotina?

Quais cidades são mais pautadas pela empresa? E por que isso ocorre?

Existem dificuldades para a realização de uma cobertura regional? Se sim, quais são elas?

Quando passou a utilizar o WhatsApp como ferramenta de trabalho?

Como ocorreu o processo de inserção do WhatsApp na sua rotina de trabalho?

Quais as vantagens e desvantagens do uso do WhatsApp no processo de produção da notícia?

A chefia incentiva o uso do WhatsApp pelos jornalistas?

Fonte. Elaborado pelas autoras.

4. Análises

4.1. Definição e prática do jornalismo regional

De modo geral, os entrevistados entendem o jornalismo regional como o trabalho de produção de notícias que acontece ou que interessam àquela região específica, região de proximidade, no caso, o estado do Tocantins. E o fazem de forma a alcançar a maior parte das cidades tocantinenses, retratando seus costumes, crenças e acontecimentos, como pode ser visto nos depoimentos a seguir:

Para o repórter da TV Anhanguera, Kaliton Mota (2023), o jornalismo regional é o ato de transformar uma notícia nacional em regional, com características da localidade. “O jornalismo regional nada mais é que trazer uma realidade mais próxima” (Mota, TV Anhanguera, 2023, informação verbal).

Na visão de Botelho (2023), da TV Anhanguera, o conceito de jornalismo regional é focar na região em que se trabalha, mostrar a cultura, como as pessoas vivem e retratar o local no qual vivem. Para Peres (2023), também da TV Anhanguera, o jornalismo regional vai além do trabalho feito pela TV na região, pois é preciso saber se o que acontece em outros estados e avaliar se terão impactos no Tocantins.

Na concepção da coordenadora da CBN Tocantins, France Santiago (2023), o jornalismo regional atende as demandas da comunidade local com abordagens em diversos âmbitos. Na visão de Regis (2023), da CBN Tocantins, o jornalismo regional é voltado à cultura local em diversos sentidos, abrangendo tudo daquela região específica. Da mesma forma, Costa (2023), entende o conceito como o retrato das notícias de onde se mora, o que está ao redor e na região, desta forma diminui o deserto de notícias e contribui para o alcance da cobertura regional.

As percepções dos jornalistas vão ao encontro do que é descrito por Peruzzo (2003) quando ela afirma que o território geográfico é insuficiente para entender o jornalismo regional. É necessário observar os laços de familiaridade no campo das identidades histórico-culturais (língua, tradições, valores, religião etc.) e de proximidade de interesses (ideológicos, políticos, de segurança, crenças etc.) para determinar o raio de abrangência regional de um veículo.

Com relação a como é feito o jornalismo regional, a TV Anhanguera e a CBN Tocantins utilizam-se de diferentes estratégias no seu cotidiano: contato com assessorias e contato direto com as fontes; produção vinda das praças em Araguaína e Gurupi, no caso da TV e, Araguaína quando se trata da rádio; e deslocamento dos jornalistas até outros municípios. Na TV, o deslocamento acontece de forma menos frequente, e é adotado sempre levando em consideração a relevância do assunto.

Em situações em que a produção da TV tem interesse em noticiar acontecimentos de outras cidades, mas não consegue enviar um jornalista até o local, opta-se pela construção coletiva com as fontes, com o envio de vídeos, áudios e fotos que serão reproduzidas nos telejornais. Esse método ‘a muitas mãos’ (participação de muitas pessoas), por intermédio das ferramentas disponibilizadas pelo WhatsApp está inserido no que descreveu Santos Filho et al. (2009), ao observar a inserção do aplicativo nas redações como nova forma de organização de adaptação das empresas jornalísticas às novas tecnologias digitais. Permite mais aproximação entre leitor/internauta e jornalista, no envio de sugestões de pautas, denúncias, e consulta de dados pelos jornalistas às suas fontes (Meireles & Coêlho, 2014).

Dentre as práticas de cobertura regional, o deslocamento até outros municípios é a menos utilizada dentro das redações. Prevalece o contato a distância pelos meios tradicionais ou pelas mídias digitais, com destaque para o WhatsApp. O papel das assessorias de comunicação é destacado, pois a maior parte do noticiário regional é construído por provocação das assessorias. Ou ainda com participação delas em algum momento do processo de produção, bem como no resultado final: a notícia no ar.

4.2. WhatsApp na produção de notícias regionais e a relação com as cidades do interior

Dentro da lógica de produção de notícias regionais, o WhatsApp é apontado pelos jornalistas como um facilitador do contato com as comunidades do interior do estado, suprindo, em parte, as deficiências no ambiente laboral TV Anhanguera e CBN Tocantins, com o enxugamento das redações e consequente excesso da carga de trabalho. Desta forma, o aplicativo tornou mais fácil o trabalho de apuração, não só dos acontecimentos em Palmas, mas nas demais localidades, expandindo a área de alcance da equipe.

A proximidade com a audiência é destacada por Rehbein (2023), ao considerar o WhatsApp divisor de águas e algo transformador, abrindo novas possibilidades de relacionamento com os telespectadores de outras cidades. Quando iniciou sua carreira na comunicação, especificamente na TV, a jornalista lembra que para conseguir personagens e histórias boas, recorriam à lista telefônica, de forma aleatória e contando apenas com a sorte

Da mesma forma, Botelho (2013) relembra quando usava a lista telefônica como meio para conseguir fontes, principalmente de outras cidades. “Na época, eu abria a lista telefônica, escolhia um número e ligava para as pessoas, e às vezes, elas até diziam assim ‘nossa, mas é da TV Anhanguera?’ (Botelho, 2013, TV Anhanguera).

Quanto à facilidade trazida pelo WhatsApp no alcance das cidades interioranas pela CBN Tocantins, Santiago (2023), diz que o aplicativo simplificou muito todo o processo de apuração, principalmente por sua rapidez. “A sugestão chega e já corremos atrás para apurar aquela informação e outros todos os lados. Então o WhatsApp é muito eficaz, principalmente no rádio” (Santiago, 2023, CBN Tocantins, informação verbal).

A proximidade com as cidades do interior pelo WhatsApp também é vista a partir da presença dos jornalistas da TV em grupos de outros municípios, locais com grande circulação de informação e de captação de fontes. Os grupos se mostram um importante recurso para captação de notícias vindas das cidades do interior. A postura adotada pelos entrevistados é mais de observação do que se é publicado, mas a depender da quantidade de mensagens em circulação, não é possível ler todas.

A partir dos depoimentos, percebe-se que o aplicativo mudou a configuração da cobertura dos acontecimentos regionais, fortalecendo a proximidade cultural e a resposta imediata da audiência, dando voz às fontes, tornando-as protagonistas das próprias narrativas. Tais constatações corroboram com a visão de Reis, Thomé (2017) ao afirmarem que as audiências viram no WhatsApp uma forma de se aproximarem dos jornalistas e auxiliarem na construção de uma programação feita por eles e para eles.

Quando não conseguem o número do WhatsApp, muitas fontes do interior recorrem às redes sociais dos jornalistas da TV, como Instagram e Facebook, para fazer sua sugestão de pauta, denúncia ou reivindicação. Mota (2023) afirma, por exemplo, que já foi procurado no Instagram por fontes das cidades tocantinenses de Guaraí, Pium e Araguaína.

Ainda neste segundo eixo, questionou-se aos entrevistados como são selecionados os acontecimentos do interior que chegam pelo WhatsApp. Nas respostas, eles indicaram a existência dos valores-notícias como aspectos norteadores na tomada de decisões, apenas não enumeram de forma clara quais são, mas percebeu-se a partir dos exemplos de notícias citadas por eles, a proximidade geográfica, tragédia/drama, justiça, surpresa, raridade, conhecimento/cultura, conflito, como valores usados no momento de inclusão e exclusão das informações. Além disso, percebeu-se que utilizam a checagem básica como forma de acolhimento desta informação, buscando principalmente, confirmação de fontes oficiais.

Já as cidades que são mais pautadas pela TV Anhanguera, conforme descrito pelos entrevistados, são Almas, Aparecida do Rio Negro, Araguaína, Dianópolis, Gurupi, Itacajá, Lajeado, Miracema, Natividade, Palmas, Paraíso do Tocantins, Peixe, Porto Nacional e Tocantínia. Depois de Palmas, Araguaína e Gurupi registram mais tempo de tela, justamente por sediarem as praças e terem equipes próprias. O tamanho dessas cidades e o poderio econômico também são as justificativas apontadas por Botelho (2023) para a constância na cobertura dessas três cidades pela TV Anhanguera.

A visão da jornalista é reforçada por Rocha (2017) ao explicar que as cidades de Palmas, Araguaína e Gurupi já existiam antes da criação do Tocantins, em 1988, e, portanto, já concentravam recursos econômicos e desfrutavam de uma organização político-administrativa mais estruturada. Além disso, são locais cortados pela BR-153 (Belém-Brasília), principal via de acesso da região norte com o centro-sul do país, reconhecida historicamente como elemento propulsor da economia tocantinense.

Questionados sobre o perfil de quem entra em contato no número institucional das cidades do Tocantins, os entrevistados da TV Anhanguera são unânimes em afirmarem que os telespectadores, neste caso, pessoas comuns, são os que mais enviam mensagens. Os assessores de comunicação também são citados pelos entrevistados, mesmo enviando sugestões de pautas por e-mail, ainda reforçam o assunto via WhatsApp.

Com o WhatsApp, as fontes do interior tiveram o acesso facilitado aos jornalistas, mas a ausência da presença física dos jornalistas nesses locais cria um problema: como saber se existe verdade nesses fatos? A solução encontrada pela TV é a confirmação a partir da constância do aparecimento dessa informação por fontes diferentes, bem como a checagem por ligação telefônica, feita, principalmente, no comércio da cidade, caso o jornalista não tenha nenhuma fonte confiável na cidade.

Na explicação dada por Pires (2023), a checagem é sempre feita a partir de outros contatos na localidade. As ligações costumam ser aleatórias e, conforme a similaridade das informações aparecem, toma-se como algo verdadeiro. Se foi uma notícia de grande impacto, a cobertura então passa a ser presencial.

Quanto ao fluxo desta checagem na CBN Tocantins, quando é possível envolver uma fonte oficial, assim o fazem. Neste ponto, a construção de uma rede confiável de fontes é essencial, principalmente no interior, por nem sempre possuir assessorias de comunicação estruturadas para auxiliar os jornalistas. Costa (2023) enumera como fontes comuns os policiais, prefeitos, secretários municipais e ouvintes que podem indicar o caminho até se chegar à fonte de interesse.

Com base nos depoimentos é possível concluir que as cidades do interior e suas fontes veem no WhatsApp uma ferramenta facilitadora do acesso à imprensa regional. Os temas considerados pertinentes por eles, são levados aos jornalistas, numa tentativa de serem ouvidos e terem seus problemas solucionados. Percebeu-se ainda que, conforme descrito pelos entrevistados, as cidades mais pautadas são as que possuem emissoras da TV Anhanguera e CBN Tocantins, ou são próximas a elas. No caso da TV, pode-se pensar ainda, sobre o alcance do sinal da emissora nesses locais, pois desta forma, com uma audiência acostumada a acompanhar os noticiários locais, tende a participar da construção dessa programação. Em relação à rádio, acredita-se se pela quantidade de notícias que podem ser extraídas dessas cidades mais populosas.

4.3. Inserção do WhatsApp na rotina de trabalho

A respeito do momento em que o WhatsApp foi adotado na rotina de trabalho, só três entrevistados da TV Anhanguera souberam datar quando ocorreu. Os demais descreveram como algo naturalmente assimilado no trabalho, inicialmente da forma individualizada e, posteriormente com a criação dos grupos de trabalho, sem que houvesse uma determinação formal da empresa, mas como a maior parte do trabalho passava pelo aplicativo, muitos se viram obrigados a usar o WhatsApp.

A editora do BDT, Jocyelma Santana, adotou a ferramenta no ano de seu lançamento no Brasil, em 2009, e apostava na interatividade proporcionada pelo aplicativo, introduzindo nos telejornais da TV Anhanguera, com a reprodução de mensagens e imagens nos equipamentos da TV. A apresentadora lembra do estranhamento dos telespectadores e do manuseio da equipe.

A frente deste pioneirismo desde dezembro de 2007, quando foi contratada pela TV Anhanguera na função de produtora, Botelho (2023) confirma o aparecimento do WhatsApp por iniciativa própria dos membros da TV Anhanguera, posteriormente integrada de forma individual e, por fim, nos grupos.

Porém, Rehbein (2023) discorda dessa adoção rápida da ferramenta, como citado acima. A jornalista lembra que levou um tempo para a redação inserir o aplicativo nas atividades. “No começo eu usava para conversar com fontes específicas. Com o tempo, fomos nos familiarizando, entrando nos grupos e entendendo como funcionava (Rehbein, TV Anhanguera, 2023). Mas a jornalista atribui o protagonismo do WhatsApp em muitas apurações, principalmente as investigativas

Três entrevistados da TV Anhanguera iniciaram a carreira no telejornalismo pós-WhatsApp na própria emissora. Dois anos após iniciar sua carreira como jornalista é que Peres (2015) passou a usar o WhatsApp para trabalhar, marcado pela sua entrada na TV Anhanguera. Já Pires (2023) cita 2016 como ano de adoção da ferramenta. Para ele, o WhatsApp virou algo mais profissional do que pessoal. “Eu não tinha outra experiência no telejornalismo, comecei aqui, então já utilizava o WhatsApp, e a partir daí ficou cada vez mais frequente e meu número virou algo mais profissional” (Pires, 2023, TV Anhanguera, informação verbal).

Portanto, os jornalistas da CBN Tocantins usam a ferramenta há pouco tempo, se comparado a TV Anhanguera. E por ser a ferramenta de conversação instantânea para o fechamento das pautas e condução do dia a dia, deve ser obrigatoriamente usada por todos da CBN Tocantins.

Conclui-se, portanto, que o WhatsApp foi inserido nas redações por iniciativa dos profissionais. A sua assimilação e consolidação se deu conforme a ferramenta evoluiu e inseriu novos recursos, bem como o aumento da quantidade de usuários, mudando o comportamento dessas pessoas que deixaram de lado os meios mais tradicionais, como ligação telefônica e e-mail, em substituição às facilidades do WhatsApp.

4.4. Vantagens e desvantagens do uso do aplicativo pelos jornalistas

Referente às vantagens e desvantagens do uso do aplicativo na produção jornalística, os jornalistas entrevistados, de modo geral, enumeram mais pontos positivos que negativos no uso da plataforma. Apenas Botelho (2023), da TV Anhanguera, não descreveu nenhum ponto negativo, pois em sua visão, só existem vantagens pela facilidade no recebimento de imagens, citando a cobertura histórica do desmoronamento de uma gruta em Santa Maria do Tocantins, região nordeste do estado, em novembro de 2016. “A matéria para o Jornal Nacional foi feita inteiramente pelo celular e as imagens foram encaminhadas pelo WhatsApp. Não consigo ver desvantagens” (Botelho, 2023, TV Anhanguera, informação verbal).

A agilidade e rapidez no processo de apuração são as vantagens descritas por Rehbein (2023) e Peres (2023), da TV Anhanguera. “É com essa tecnologia que chegamos em todos os cantos do estado” (Peres, 2023, TV Anhanguera, informação verbal). Essa presteza também é lembrada por Regis (2023), pois a rotina intensa de trabalho deve ser cumprida dentro da redação, e o WhatsApp facilita cumprir a lista de demandas: apurar, gravar, editar e abastecer o sistema.

Marchesini (2023) insere o recebimento de fotografias e vídeos como uma vantagem em usar o WhatsApp na apuração jornalística feita na TV Anhanguera, principalmente pela rapidez com que isso acontece. Assim, em muitos casos, evita-se o deslocamento da equipe para captação das imagens em um caso simples.

Botelho (2023) afirma que existe a TV antes e depois do WhatsApp. O aplicativo tem facilitado a cobertura dos mais diversos assuntos e ameniza as deficiências surgidas pelo sucateamento das redações jornalísticas em todo o país. Antes do WhatsApp, o meio eletrônico de comunicação instantânea entre o público e a redação era o telefone. Hoje em dia é raro o recebimento de ligações no relacionamento com as fontes, como descrito por Botelho (2023).

Sob o ponto de vista de Pires (2023), sem o WhatsApp os profissionais teriam dificuldade em realizar a cobertura de notícias, principalmente por Palmas não ser uma cidade agitada, pois nem tudo que acontece pode virar notícia, e quando isso acontecer, pode não ser relevante e chamar a atenção da TV Anhanguera.

Pires (2023) concorda com a facilidade da proximidade com as fontes como uma vantagem, em qualquer hora do dia, semana ou lugar, bastante ter apenas acesso à internet. Sendo assim, as pessoas respondem mais rápido e a produção diminui o tempo de fechamento dos espelhos dos telejornais.

Como desvantagens, Rehbein (2023), Peres (2023) e Marchesini (2023) concordam com a circulação facilitada de informações falsas como um peso e empecilho na checagem de fatos. Da mesma forma, Santana (2023) relacionada a falta de confiança como principal desvantagem em usar o WhatsApp na construção de notícias, pois nem tudo que é dito pelas pessoas é tomado como verdade, além das fontes considerarem a denúncia feita à TV como ação suficiente para ver sua matéria no ar.

Dois jornalistas da CBN Tocantins também elegem como desvantagens a grande quantidade de informações em circulação, baixa qualidade dos áudios, em comparação a gravação em aparelhos próprios para este fim, e a extensão do trabalho. Para Regis (2023), a enxurrada de informações em circulação no aplicativo tem como consequência a sobrecarga do trabalho de apuração.

Outra desvantagem descrita, especificamente na CBN Tocantins, é a baixa qualidade de alguns áudios recebidos, pois nem sempre a pessoa possui um smartphone moderno (Costa, 2023). Também é considerado como aspecto negativo a extensão do horário de trabalho, obrigando a uma conexão direta.

Essa carga excessiva de trabalho, além das limitações físicas das redações e horários, e grande quantidade de informações, são elementos presentes na redação digital. Esses novos espaços alteraram a construção e veiculação da notícia, conforme observado por Adriana Garcia Martinez (2010). Embora o WhatsApp simplifique o processo de apuração, ele está inserido na dinâmica da instantaneidade. O jornalista se vê envolvido em uma vasta rede de atividades que ocorrem simultaneamente no aplicativo, como participação em grupos de trabalho e acompanhamento de diversas conversas individualizadas.

Essas redações frenéticas comprovam as constatações de Simone Lima (2022) em seu estudo sobre as atuais redações jornalísticas, caracterizadas por uma rotina multitarefa, que inclui a realização de entrevistas, gravação de conteúdo com smartphone, rondas nas redes sociais, publicação das matérias, dentre outras obrigações.

Diante desses depoimentos, fica explícito que os benefícios do WhatsApp se sobressaem aos malefícios (ou desvantagens) proporcionados pela ferramenta à rotina de trabalho dos jornalistas. Situação oriunda do enraizamento do aplicativo no contexto do jornalismo, proporcionando agilidade no cumprimento das demandas diárias, ampliação do alcance das fontes residentes em lugares mais distantes dos jornalistas, facilidade no recebimento de conteúdo multimídia e cobertura dos mais diversos, associado às deficiências surgidas pelo sucateamento das redações jornalísticas. Devido a esta realidade, aspectos negativos trazidos com o WhatsApp, como a circulação de uma grande quantidade de informações falsas e o comodismo no trabalho diário, deixam se ser refletidos/debatidos pelos profissionais.

Essas mesmas observações dialogam com os achados de Bueno et al. (2021) ao estudarem o WhatsApp nas redações de Imperatriz, no Maranhão. As autoras encontraram características similares das vantagens descritas pelos respondentes desta pesquisa sobre a utilização do WhatsApp no processo de produção das notícias: agilidade, proximidade e ampliação das fontes. E da mesma forma constaram, que os jornalistas apontam os benefícios em detrimento aos aspectos negativos, e em alguns casos, deixando de perceber indicativos da precarização do trabalho jornalístico e, o que Bueno et al. (2021) descrevem como “plataformização do trabalho” (p. 16)

Considerações finais

A partir dos resultados confirma-se o papel fundamental do WhatsApp na produção de notícias no estado do Tocantins. Graças ao aplicativo, os profissionais conseguem produzir conteúdo diário sobre as cidades próximas e distantes das redações sem ter de ir até o local dos fatos. Apesar da situação gerar a necessidade de uma apuração mais rigorosa para comprovar a veracidade das informações, é inegável os ganhos que ela confere ao jornalismo regional, como por exemplo, a divulgação de notícias que acontecem perto das pessoas e interferem em suas vidas cotidianas.

De certa forma, o WhatsApp tem suprido a falta de jornalistas nas emissoras de TV e rádio, tanto na capital, como no interior, principalmente na construção colaborativa dos conteúdos. A participação mais ativa das fontes do interior tem se mostrado importante na obtenção de informação. A partir do WhatsApp, os jornalistas ampliaram a rede de fontes e relacionamentos.

Por outro lado, seu uso compromete a percepção do jornalista sobre o local do acontecimento, ao mesmo tempo em que diminui os deslocamentos das equipes para as coberturas in loco. As notícias passaram a ser construídas sem a percepção dos jornalistas quanto ao ver, sentir, constatar e identificar nuances que são negligenciadas pela sociedade.

No contexto da cobertura regional, o presente estudo confirma, assim como descrito por Reis (2022), que o WhatsApp é um elemento chave no atendimento das populações localizadas em cidades vizinhas ao centro de referência. No caso do cenário tocantinense é Palmas. Reis (2022) conclui que “seu uso faz parte do processo de reconfiguração da produção noticiosa para o exercício de uma prática mais ágil e de fácil acesso às fontes e acontecimentos de modo instantâneo” (p. 191).

Dito isto, o assunto se mostra fértil e um campo a ser explorado a partir de novos recortes, como a apresentação do ponto de vista das fontes em relação ao jornalismo feito com auxílio do WhatsApp; a demonstração da visão dos jornalistas do interior sobre a construção do noticiário local a partir do aplicativo; a ampliação do estudo ao inserir veículos de outras regiões do estado do Tocantins, a fim de apresentar um cenário mais abrangente.

Outro desdobramento a ser explorado em pesquisas futuras é entender as estratégias de engajamento a partir da redistribuição das notícias em grupos, lista de transmissão, comunidades e canais, todas ferramentas disponibilizadas no WhatsApp.

Por fim, foi possível verificar, através dos relatos apresentados e discutidos no artigo, que as características do uso do Whatsapp, no jornalismo regional, discutidas à luz da produção de notícias no interior do Brasil, convergem na emergência tecnológica e midiática e contribuem para o avanço das pesquisas em comunicação e para refletir sobre os impactos no trabalho dos jornalistas.

Declaração sobre a contribuição específica de cada um dos autores (Taxonomía Credit)

Esboço biográfico dos autores

Fernanda Alves de Mendonça é um mestre em Comunicação e Sociedade pela Universidade Federal do Tocantins (UFT). Possui pós-graduação em Gestão de Crises nas Organizações Públicas e Privadas (WPOS); e MBA em Gestão de Agronegócios (UFT). Graduada em Comunicação Social - Jornalismo pela UFT. É membro do Grupo de Pesquisa em Jornalismo e Multimídia (Nepjor).

Thays Assunção Reis - Professora do curso de Jornalismo e do Programa de Pós-Graduação em Comunicação (PPGCOM) da Universidade Federal do Tocantins (UFT). Doutora em Comunicação (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), mestre em Jornalismo (Universidade Estadual de Ponta Grossa) e graduada em Comunicação Social-Jornalismo (Universidade Federal do Maranhão).

Referências

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[1] O artigo é um recorte da dissertação da ‘WhatsApp e a prática do jornalismo regional nas redações jornalísticas da TV Anhanguera e CBN Tocantins”, apresentada em março de 2024, ao programa de Pós-Graduação em Comunicação e Sociedade da Universidade Federal do Tocantins (UFT) para obtenção do título de Mestre em Comunicação e Sociedade.

[2] A data é uma referência aos estudos iniciais sobre o WhatsApp, pois não foi localizado uma data precisa da

inserção da ferramenta nas redações.

[3] Levantamento realizado no Banco da Capes e na Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD).

[4] São cidades que não são capitais estaduais ou estão localizadas em áreas metropolitanas. Possuem população em torno de 100 a 500 mil habitantes, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2011).

[5] É uma plataforma que tem como objetivo facilitar o acesso a informações sobre teses e dissertações defendidas junto a programas de pós-graduação do Brasil.

[6] É um portal, mantido pelo Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT), que reúne e disponibiliza os sistemas de informação de teses e dissertações existentes no país.

[7] Durante os encontros foi solicitado aos entrevistados assinarem o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Federal do Tocantins. O Certificado de Apresentação de Apreciação Ética (CAAE) está registrado com o número: 66488522.5.0000.5519.