Nº 66 | OTOÑO 2024

ISSN: 1139-1979 | E-ISSN: 1988-5733 © 2024. E. Universidad de Sevilla.

CC BY-NC-SA 4.0

10.12795/Ambitos.2024.i66.02

pp. 13-32


Jornalismo local plataformizado: uma análise dos veículos jornalísticos Voz Bico, Folha do Bico e Tocnotícias

Platformed local journalism: analysis of journalistic vehicles Voz do Bico, Folha do Bico, and Tocnoticias

Alan Milhomem da Silva

Universidade Federal do Amapá́ | Universidade Federal de Santa Catarina | Campus Universitário, Trindade, 88040-970 Florianópolis | Brasil |

0000-0001-9129-4355 | milhomemalan@gmail.com

Liana Vidigal Rocha

Universidade Federal do Tocantins | Campus Universitário de Palmas, Av. Juscelino Kubitscheck, 77001-090 Palmas | Brasil |

0000-0001-7506-8577 | lianavidiga@uft.edu.br

Recepción 24/04/2024 · Aceptación 05/06/2024 · Publicación 15/10/2024


Resumo

A plataformização atua com um modelo de governança algorítmica que afeta os âmbitos do processo jornalístico, desde a produção, divulgação e circulação das informações (Dolata & Schrape 2022; Silva et al., 2020). Assim, o objetivo deste trabalho é descrever e caracterizar o uso de plataformas digitais por veículos jornalísticos locais na microrregião do Bico do Papagaio, no Tocantins, estado da região norte do Brasil. O estudo se justifica por conta do papel de destaque do consumo de notícias via redes sociais na internet além disso o Bico do Papagaio conta com poucos estudos sobre o consumo na área do jornalismo. Metodologicamente, a pesquisa segue a linha exploratória e descritiva, considerando a observação, registro e análise dos dados (Gil, 2021). Quanto aos processos técnicos, seguimos com análise de conteúdo dos dados coletados a fim de verificar as características destes materiais. para coletar, categorizar e analisar os conteúdos publicados durante duas semanas por três veículos locais (Voz do Bico, Folha do Bico e Tocnotícias) nas plataformas Instagram, Facebook, X (antigo Twitter), YouTube e em suas páginas na web. Foram analisados 250 textos jornalísticos publicados e mais de 150 publicações em redes sociais. Os resultados demonstram uma plataformização dos veículos analisados com perfis nas redes sociais, além de sistema de gerenciamento de conteúdo. Também ficou evidente que há uma produção e circulação de conteúdos limitadas e sem estratégia para a construção de uma presença mais robusta e interativa nas plataformas, visando um maior engajamento e aproveitamento das possibilidades disponíveis.

Palavras-chave: plataformização, jornalismo local, Bico do Papagaio, Tocantins.

Abstract

The platform operates with an algorithmic governance model that affects the spheres of the journalistic process, from the production, dissemination and circulation of information (Dolata & Schrape 2022; Silva et al., 2020). Thus, the objective of this work is to describe and characterize the use of digital platforms by local journalistic vehicles in the microregion of Bico do Papagaio, in Tocantins, state of northern Brazil. The study is justified by the prominent role of news consumption via social networks on the internet and this micro-region has few studies. Methodologically, the research follows the exploratory and descriptive line, considering the observation, registration and data analysis (Gil, 2021). As for the technical processes, we followed with content analysis of the data collected in order to verify the characteristics of these materials. to collect, categorize and analyze content published over two weeks by three local media outlets (Voz do Bico, Folha do Bico and Tocnotícias) on Instagram, Facebook, X (formerly Twitter), YouTube and websites. 250 published journalistic texts and more than 150 publications on social networks were analyzed. The results demonstrate a platform of the analyzed vehicles with profiles on social networks, as well as a content management system. It was also evident that there is a production and circulation of limited content and no strategy for building a more robust and interactive presence on platforms, aiming at greater engagement and use of the available possibilities.

Keywords: platformization, local journalism, Bico do Papagaio, Tocantins.


1. Introdução

Neste trabalho partimos do contexto do jornalismo pós-industrial (Anderson et al.,2013) e dos debates sobre a “sociedade das plataformas” (Van Dijck et al., 2018), que discutem o papel das empresas de tecnologia nas relações humanas, econômicas, sociais e no ecossistema midiático internacional. Compreendemos as plataformas digitais a partir de Dolata & Schrape, que as definem como “espaços sociais, de mercado, de consumo ou de serviços estruturados tecnologicamente, nos quais os atores sociais interagem com base em regras detalhadas e tecnicamente definidas” (2022, p. 5, tradução nossa). Assim, exercem influência na economia, nas práticas sociais e culturais da sociedade.

As pessoas aderem a essas plataformas por diversas razões, entre elas as sociais, financeiras e culturais. No entanto, Lehdonvirta (2022) alerta que a participação é sempre restrita às formas definidas pelo controlador, configurando este espaço como uma rede privada, com regras definidas unilateralmente e controlada pela chamada empresa-plataforma. Nos últimos anos, as empresas de maior adesão são controladas pelas Big Five Techs, isto é, as cinco maiores empresas do ramo: Google, Meta, Apple, Amazon e Microsoft. Conforme Van Dijck et al. (2018), essas plataformas realizaram coleta, circulação e monetização de dados de usuários a partir de contratos extensos e complexos e dificilmente lidos pelos usuários. Ou seja, é um ambiente ainda obscuro de funcionamento e que carece de estudos e regulação e transparência no funcionamento.

Ainda segundo Van Dijck et al. (2018), as maiores plataformas estruturais que subsidiam com dados ou suporte as demais. Essas empresas comandam uma economia de plataforma mundial que, conforme Silva et al. (2020), se baseia em três pilares tecnológicos: grande volume de dados (o big data, que se refere a enorme quantidade de dados disponíveis), inteligência artificial (transformar dados em valor de uma forma mais automatizada) e computação em nuvem (que se refere à democratização do poder de computação para empresas).

Ainda segundo os autores, uma das tendências que essas três tecnologias combinadas geram é a “plataformização”, isto é, a organização da atividade socioeconômica em torno de plataformas digitais. Vale destacar que as arquiteturas tecnológicas e as escolhas de governança das plataformas não são neutras e afetam o funcionamento tanto das democracias quanto dos mercados (Van Dijck et al., 2018). Além disso, essas empresas digitais contribuem na transformação de comportamentos sociais. Nesse sentido, D’Andréa (2020) alerta que esse é um processo complexo de via de mão dupla, que envolve um assimétrico jogo de poder, formado pela coprodução entre artefatos tecnológicos e práticas sociais.

No jornalismo, a plataformização tem impactado a produção, a natureza e a forma dos produtos jornalísticos, além do profissional que passa a ser um “jornalista metrificado” (Kalsing, 2021). Há também forte interferência na circulação de informações, apontando os chamados desarranjos da visibilidade (Santos-Junior, 2021), isto é, a pouca visibilidade e compartilhamentos dos veículos jornalísticos e a captura da atenção por políticos e criadores digitais.

É neste contexto que o processo de plataformização do jornalismo tem ganhado destaque, por isso, o objetivo deste trabalho é descrever e caracterizar a produção plataformizada de veículos locais da microrregião do Bico do Papagaio, no estado do Tocantins, localizado na região norte do Brasil. Para tanto, foi realizada uma análise descritiva das publicações de três veículos locais (Voz do Bico, Folha do Bico e Tocnoticias) nas plataformas Instagram, Facebook, X (antigo Twitter), YouTube e em suas páginas na web.

O estudo se justifica por conta do papel de destaque do consumo de notícias via redes sociais na internet. Segundo o Perfil do Jornalista Brasileiro 2021 (Lima & Mick, 2022), mais da metade dos profissionais de fora da mídia desenvolvem funções para as redes sociais. O Reuters Institute (2022) apontou que, no Brasil, cerca de 83 % da população acessa a internet para se informar e possui perfis em redes sociais. Desse montante, 47 % dos usuários procuram se informar pelo Facebook, 43 % via WhatsApp e 39 % no YouTube. Por isso essas plataformas foram escolhidas para análise. Desta forma, o artigo está estruturado em três partes: o marco teórico que fundamenta o trabalho; os procedimentos metodológicos; resultados e discussão dos dados encontrados.

2. Jornalismo no contexto da plataformização

Um dos entendimentos sobre plataformização é como um processo de organização da atividade socioeconômica em torno de plataformas digitais. Para além disso, Jurno (2020) destaca que neste processo as Big Techs também organizam e disponibilizam dados e informações sobre os usuários, além de oferecerem viabilização de empresas nos mais diferentes setores sociais. Neste contexto, Neiborg & Poell (2018) afirmam que a ‘plataformização’ é a interrelação da lógica das plataformas nas lógicas de produção dos mais variados setores, inclusive do jornalismo. Isso leva estes setores a se adequarem às lógicas das plataformas.

Jurno (2020) salienta que essas plataformas, como o Facebook, se oferecem enquanto infraestrutura para as instituições jornalísticas e buscam convencê-las a concordarem em colocar seus conteúdos dentro dos domínios delas. Quando ocorre essa junção, Napoli & Caplan (2018) alertam que essas empresas digitais passam a estabelecer questões editoriais sobre o que pode e o que não pode circular em suas ambiências, ou seja, o que os veículos jornalísticos publicam deve estar de acordo com as regras das plataformas. Caso isso não ocorra, os conteúdos podem ser banidos ou têm alcance limitado pelos algoritmos. Assim, de acordo com Jurno (2020), essas estruturas digitais orientam a forma como jornalismo e usuários vão se conectar, construindo novos regimes de valor.

A plataformização não apenas afeta a independência dos veículos jornalísticos, mas também promove uma separação mais nítida entre o jornalismo e a produção de notícias, ao permitir que uma ampla gama de produtores distribua e monetize conteúdos. Isso resulta em uma apresentação confusa e misturada das informações, na qual os algoritmos das plataformas tendem a colocar cada indivíduo em uma bolha personalizada de preferências e interesses. Essa dinâmica implica que conteúdos com alto engajamento, incluindo desinformação, ganhem maior visibilidade, enquanto outros, potencialmente de maior qualidade jornalística, ficam com menos visibilidade (Van Dijck et al., 2018).

Ao longo dos últimos anos, as plataformas transformaram a forma como as pessoas acessam informações jornalísticas, que passam a ser divulgadas em cards, vídeos curtos, imagens e texto nas plataformas para direcionar o usuário ao conteúdo jornalístico no veículo de origem. Isso afeta toda a cadeia de produção de notícias, que passa pelo processo produtivo, pelo profissional, estratégias de circulação e monetização. Tudo isso na busca ativa pelas oportunidades oferecidas pelos intermediários digitais (Nielsen & Ganter, 2018).

Neste contexto, vale destacar que nas plataformas de mídias sociais as pessoas podem compartilhar notícias ou qualquer tipo de conteúdo para qualquer audiência sob uma governança obscura dos algoritmos que fazem esses conteúdos circularem de diversas formas. Desta maneira, ao mesmo tempo em que o jornalismo pode ter alcance maior da audiência e o maior engajamento do público, os veículos são levados a publicar mais conteúdos que apresentam maior engajamento junto ao público em detrimento de assuntos que sejam também relevantes, gerando uma possível dependência das métricas. Assim, as plataformas de mídias sociais não apenas comprometem o controle das organizações jornalísticas sobre a seleção de notícias, mas também minam a posição privilegiada do jornalista profissional como mediador nesse processo como apontado por Jurno & D’Andréa (2020) e Van Dijck et al. (2018)

Assim, a plataformização no jornalismo se configura, a partir de Van Dijck et al. (2018), como “um processo que resulta da interação entre plataformas, redes de anúncios, notícias e organizações de fact-checking, anunciantes e bilhões de usuários” (p. 71, tradução nossa). Essa relação é cada vez mais baseada num modelo de interesses presumidos pelos algoritmos e usuários datificados. Dados estes que são moldados pelas estratégias tecno-comerciais das plataformas não conhecidas de forma transparente pelo público e pelos veículos jornalísticos.

O compartilhamento de notícias gera algoritmos responsáveis por decidir as informações jornalísticas a serem visualizadas nos feeds dos usuários. Isso também altera, segundo Pádua & Oliveira (2021), os critérios de seleção dos valores-notícia e de edição jornalística, que agora estão sujeitos à constante apropriação e ressignificação do público a partir dos engajamentos nas redes sociais. Conforme Steensen & Westlund (2020), isso torna o jornalismo mais suscetível à manipulação, desinformação e falta de credibilidade.

Como apontado no estudo de Santos-Junior (2021), há um declínio acentuado na capacidade da imprensa jornalística de disseminar suas publicações no Facebook, em favor de políticos e de páginas apócrifas. Recuero (2021) e Recuero et al. (2021) também observam algo semelhante e afirmam que há uma tendência de maior atividade na propagação de conteúdo desinformativo em comparação com o conteúdo informativo no X (antigo Twitter). Ou seja, os conteúdos da imprensa tradicional têm uma menor visibilidade nas plataformas de redes sociais digitais se comparados com conteúdos de políticos, de criadores digitais ou de desinformação.

Esse contexto de plataformização do jornalismo também tem levado à precarização das condições de trabalho, ao profissional multitarefa, a monitoria constante das redes digitais, entre outros elementos. Há uma cisão com as práticas tradicionais da imprensa, além de demandas para a adoção de novas gramáticas comunicacionais, um redesenho das rotinas produtivas e a prevalência pelas lógicas da monetização das audiências (Nicoletti & Figaro, 2022).

3. Jornalismo local: apontamentos sobre o Bico do Papagaio

O jornalismo local é caracterizado pela proximidade geográfica com o público, as fontes e os fatos noticiados, além da identidade sociocultural e histórica com os territórios e sociedades nos quais estão inseridos (Aguiar, 2016). Os veículos locais informam e orientam a população sobre o que se passa na cidade, seja ela grande ou pequena, nos variados âmbitos (Deolindo & Curvello, 2023). Neste trabalho, analisamos os veículos locais da microrregião do Bico do Papagaio, no Tocantins.

Localizado na região Norte do Brasil, o Tocantins conta com uma área territorial de 277.423,627 km2 e é formado por 139 municípios. Com uma população de 1.511.460 pessoas (IBGE, 2022), o estado do Tocantins é dividido geograficamente em oito microrregiões: Bico do Papagaio; Araguaína; Miracema; Porto Nacional; Rio Formoso; Gurupi; Dianópolis e Jalapão. Os municípios de Araguaína, Gurupi e Palmas (a capital) se destacam por serem os mais populosos e por concentrarem os distritos industriais do estado.

No cenário midiático, o Grupo Jaime Câmara é a maior empresa de comunicação que atua no estado e possui rádios, sites e canal de TV nas cidades de Palmas, Araguaína e Gurupi. A principal característica da mídia tocantinense é a dependência das verbas públicas e da publicidade política (Rocha et al., 2014).

Em 2020, o Mapa da Mídia, elaborado pelo Grupo de Pesquisa em Jornalismo e Multimídia da Universidade Federal do Tocantins (NEPJor/UFT), catalogou 74 sites, 4 jornais, 18 emissoras de televisão e 61 rádios presentes no estado. Com relação aos jornais impressos, dos quatro que ainda continuam imprimindo suas edições, três ficam em Palmas e apenas um no interior, localizado na cidade de Pedro Afonso. Vale ressaltar que nenhum deles circula diariamente (Rocha et al., 2020).

Na microrregião do Bico do Papagaio, objeto de estudo deste trabalho, localizada no extremo norte do Estado, o cenário midiático é marcado por muitos municípios sem veículos jornalísticos. Na última atualização do Mapa da Mídia do Tocantins, o Bico do Papagaio contava com 13 veículos de comunicação, entre rádios e sites, distribuídos em oito municípios dos 25 que compõem a microrregião. Não há registros de canais de televisão e jornal impresso em circulação na microrregião no ano de 2020. Já o Projeto Atlas da Notícia (2023), atualizado em 2023, contabilizou 17 veículos de comunicação distribuídos em 11 municípios.

Diante deste cenário de dados divergentes, optou-se por trabalhar com veículos que já estão em operação há mais de 10 anos e têm produção diária de notícias. Desta forma, foram selecionados os veículos jornalísticos Voz do Bico, Folha do Bico e TocNotícias. Sediado no município de Tocantinópolis, o Tocnoticias surgiu em 2007, quando um grupo de quatro amigos resolveu aproveitar as possibilidades da internet no momento e criar vídeos para a plataforma YouTube. No ano seguinte, decidiram criar um blog para publicar notícias de Tocantinópolis e região. Em 2011, o blog migrou para o site [https://www.tocnoticias.com.br] e, atualmente, apenas Roberlan Barbosa é responsável pelo veículo, que é a principal mídia jornalística de Tocantinópolis com atualização diária (Silva & Rocha, 2023).

O Voz do Bico é oriundo do jornal impresso Folha do Interior, que começou a circular em Augustinópolis na década de 1980 com o objetivo de noticiar os acontecimentos da microrregião. O periódico permaneceu com o primeiro nome até 1994, quando passou a se chamar Voz do Bico e ser comandado por Paulo Palmares, que segue até hoje. O jornal impresso circulou pela última vez em 2018 e, desde então, o veículo funciona apenas na versão on-line [www.vozdobico.com.br] (Silva & Rocha, 2023).

Com mais de 15 anos de atuação no Bico do Papagaio e sediado na cidade de Araguatins, o site Folha do Bico [https://www.folhadobico.com.br/] é nativo digital, conta com atualização diária e se afirma como plural, independente e o mais dinâmico da região. Além disso, busca noticiar problemas políticos, cotidiano, meio ambiente, fatos simples da região e divulgação de biografias de destacados cidadãos biquenses. Apresentado este cenário midiático local, são detalhados a seguir os procedimentos metodológicos para coleta e análise dos dados.

4. Metodologia

A pesquisa apresentada segue a linha exploratória e descritiva, considerando a observação, registro e análise dos dados, destacando suas características, causas e relações. Neste tipo de investigação, o pesquisador registra e descreve os fatos observados sem interferir neles com o intuito de descobrir a frequência com que um fato ocorre, sua natureza, suas características e relações com outros fatos (Prodanov & Freitas, 2013; Gil, 2021).

Quanto aos processos técnicos, a primeira parte da pesquisa foi a revisão bibliográfica em livros e artigos para a contextualização das temáticas, a saber: jornalismo, plataformização e Bico do Papagaio. Posteriormente, procedeu-se com a coleta das postagens dos veículos nos perfis do Instagram, Facebook, YouTube e X (antigo Twitter), além dos websites de cada veículo.

Os sites foram analisados durante duas semanas, entre os dias 15 e 28 de janeiro de 2024, com o objetivo de descrever e caracterizar nas plataformas analisadas, mostrando se o conteúdo segue os principais preceitos das mídias digitais, como interatividade, instantaneidade, compartilhamento, multimidialidade e convergência.

A coleta do material foi sistematizada, destacando os principais pontos das plataformas, como as divisões dos websites, recursos de com compartilhamento, conteúdo multimídia, número de seguidores, publicações, tipos de informação e frequência. De posse de todo o material coletado e organizado, foi possível perceber as narrativas e estratégias plataformizadas dos veículos jornalísticos locais analisados. Nessa fase, os dados coletados foram examinados de acordo com a discussão teórica apresentada anteriormente.

5. O jornalismo local do Bico do Papagaio no contexto da plataformização

Primeiramente foram observados os websites dos veículos selecionados. Em questão de estrutura, as homepages dos três sites analisados contam com um cabeçalho que destaca o nome, a localização, redes sociais digitais (Facebook, Instagram, YouTube e X) e editoriais ou Menu com as seções. Apenas o Tocnotícias que, na parte de redes sociais, conta apenas com e-mail, YouTube e WhatsApp.

Ainda nos sites é possível encontrar as notícias de destaque, que geralmente são quatro, a divisão dos sites em três colunas e destaques de notícias dos estados que fazem divisa com a microrregião (Pará e Maranhão), além informações nacionais e até internacionais. Todos os sites também contam com botões de buscador para pesquisar as postagens dos veículos. Curiosamente, não há divisão em editorias como é feito tradicionalmente no jornalismo.

Verificou-se que os três sites apresentam uma estrutura considerada básica, com notícias, anúncios e menu de seções. Foi possível perceber que os veículos utilizam plataformas simples ou a versão mais simples para hospedagem de seus sites. Apenas o veículo Voz do Bico e o Folha do Bico informaram que utilizam o WordPress como sistema de gerenciamento de conteúdo. Não foi verificada, nas semanas analisadas, a exploração de recursos multimidiáticos, como vídeos, infográficos, geolocalização, áudios ou mesmo hiperlinks. Dos 250 textos jornalísticos analisados, quase a totalidade (248) era composta por texto e foto, reproduzindo o modelo consolidado no meio impresso.

Apenas dois materiais foram compostos por texto, foto e vídeo. Trata-se de uma nota publicada pelo Voz do Bico com um vídeo do presidente do Hospital de Amor de Barretos, Henrique Prata, elogiando a atuação do senador tocantinense Eduardo Gomes pelo comprometimento com a obra do hospital. O material apresenta evidentes características de material produzido pela assessoria do parlamentar e que o veículo publicou sem quaisquer modificações. O outro conteúdo que conta com vídeo é uma notícia sobre os perigos de animais soltos às margens das rodovias locais. Nas imagens, enviadas por um internauta, é possível ver animais circulando próximos às rodovias.

Com relação às características do webjornalismo, aqui entendido como o jornalismo desenvolvido para a web e que possui sete características básicas: hipertextualidade, multimedialidade, interatividade, memória, instantaneidade, personalização e ubiquidade (Canavilhas, 2014), foram encontradas poucas práticas desse formato jornalístico. Sobre a utilização de hiperlinks, que é uma das principais características do webjornalismo, não foram encontradas publicações que apliquem este recurso. O que caracteriza a produção dos veículos ainda em estágios iniciais do webjornalismo. Com relação ao conteúdo dos textos jornalísticos, ao todo, foram 250 publicações nas duas semanas analisadas, com frequência média de 4 a 5 cinco textos por dia (Quadro 1). Apenas o Tocnotícias não apresentou uma regularidade nas postagens, sendo catalogado seis dias alternados sem posts no site. Os motivos não foram identificados.

Durante o período de análise, verificamos que a maioria dos textos jornalísticos é formada por notícias ou notas. Não foram encontradas reportagens ou conteúdos mais aprofundados. Além disso, os textos, em sua maioria, são divididos entre notícias regionais e locais. Ressalta-se que regional aqui é tomado como estado em sua divisão política e geográfica. Ou seja, quando citamos notícias regionais, estamos tratando de informações que abrangem todo o Tocantins ou que tratam de outros municípios que não pertencem ao Bico do Papagaio.

Quadro 1

Resumo dos textos jornalísticos publicados nos três sites analisados

Tocnotícias

Folha do Bico

Voz do Bico

Total de textos jornalísticos

42

68

140

Notícias relacionadas a microrregião

1

48

24

Total de municípios do Bico citados nas notícias

1

11

8

Notícias relacionadas ao estado do Tocantins

41

9

33

Notícias relacionadas a outros estados

0

18

15

Notícias nacionais e/ou sem localização

0

2

68

Fonte. Elaborado pelos autores, 2024.

Por outro lado, as notícias locais são os conteúdos que abordam os municípios da microrregião. Neste quesito, o Tocnotícias se destacou por, no período analisado, publicar apenas uma notícia local. O veículo que é referência na produção noticiosa em Tocantinópolis (Silva & Rocha, 2023), nas duas semanas analisadas não reportou informações sobre a região. Em contrapartida, o Folha do Bico foi o veículo que publicou o maior número de notícias locais, 48 das 68 postagens no site tratavam de informações sobre o Bico do Papagaio. Além disso, o noticioso trouxe informações de 11 municípios da microrregião. O Voz do Bico também mostrou sua vocação de veículo local e trouxe 24 produções sobre o Bico do Papagaio, citando 8 municípios locais diferentes no período analisado.

Com relação aos recursos de acessibilidade, não há nada nos três sites que atenda a este quesito, pois não tem possibilidade de aumento da letra ou ouvir o texto da reportagem. Mesmo as plataformas gratuitas hoje disponibilizando ferramentas para explorar esses recursos acessíveis, os sites não os utilizam. A realidade local demonstra uma fraqueza dos veículos em atender as pessoas com deficiências.

Sobre os compartilhamentos das notícias, os sites disponibilizam ferramentas nas suas próprias postagens, o que mostra uma interligação entre as plataformas. Ou seja, ao abrir uma notícia no Folha do Bico, o internauta terá disponíveis ícones para compartilhar esse material no Facebook, X, ou WhatsApp. Já no Voz do Bico, esse compartilhamento pode ser feito nas plataformas já citadas e no Instagram. No caso do Tocnotícias, é disponibilizado o ícone com a palavra compartilhamento que, ao clicar, o internauta é direcionado para o WhatsApp para enviar o material. Caso o leitor queira compartilhar em outra plataforma precisa copiar a URL.

Esses recursos para compartilhamento nas plataformas de redes sociais ou aplicativos de mensagens instantâneas demonstram uma interligação das plataformas, um processo de retroalimentação no qual o internauta ou o jornalista publica o material produzido pelo veículo gratuitamente em outra plataforma para circulação. Como apontam Van Dijck et al. (2018), há uma crescente dependência desses sistemas on-line por parte das empresas de mídia para fazer circular seus conteúdos. Essas combinações resultam no processo de plataformização destacado pelos autores. Os próprios veículos jornalísticos produzem seus conteúdos já em conformidade com as plataformas ou com recursos que permitem a divulgação nelas, havendo uma interferência direta no processo produtivo.

Sobre anúncios, não foram identificadas informações sobre o assunto nos sites. O que se percebeu foram vários espaços disponíveis para anúncios por meio de compra pelas empresas que queiram anunciar nos veículos. Essa informação aponta para o fato de que os sites não têm ou ainda é pouco a monetização feita pelas plataformas nos conteúdos produzidos pelos noticiosos. O indício de inovação neste processo que se observou no caso do Tocnotícias, que divulga as publicidades do veículo no site e nos stories do Instagram, Facebook e status no WhatsApp. Ressalta-se que todos os conteúdos dos sites são disponibilizados gratuitamente para os usuários.

5.1. YouTube

Outra plataforma analisada foi o YouTube, que é de compartilhamento de vídeos. Na análise, foi observado que essa plataforma é pouco explorada pelos veículos do Bico do Papagaio, sendo usada mais como um repositório dos vídeos incorporados nas notícias dos sites. Em virtude do limitado espaço no banco de dados dos veículos que geralmente utilizam versões mais baratas e até mesmo gratuitas das plataformas, a prática de postar no YouTube e linkar com o site. Desta forma, verificamos que os veículos usam o YouTube (Figura 1) para postar os vídeos produzidos ou enviados pelos internautas e depois incorporam nas publicações nos sites.

Figura 1

Página inicial dos canais no YouTube dos três sites analisados

Fonte. Captura de tela feita em 28/01/2024.

Durante o período analisado, apenas o site Voz do Bico publicou vídeos no YouTube. Na primeira semana, o veículo publicou um vídeo de quase cinco minutos sobre um livro no qual o autor parabenizava um senador tocantinense por seu apoio a projetos que atuam no combate ao câncer. O vídeo teve apenas 13 visualizações. A segunda publicação se trata de um vídeo enviado por um internauta com pouco mais de um minuto mostrando os perigos de animais soltos às margens de uma rodovia no perímetro urbano da cidade de Augustinópolis. O vídeo teve 143 visualizações em apenas três dias.

Acredita-se que as visualizações tenham sido por se tratar de um assunto local e uma problemática comum na região. Como aponta Aguiar (2016), os conteúdos marcados pela proximidade geram mais envolvimento do público local que se reconhece ou reconhece os envolvidos no assunto. Nas redes sociais (Instagram e Facebook) do veículo, este foi o conteúdo com maior engajamento, com diversas reações e comentários no período da análise.

O Folha do Bico entrou na plataforma em 2011 e tem 297 vídeos publicados até janeiro de 2024. O que mostra uma atuação tímida ao longo de 12 anos na plataforma. Isso também reflete no número de inscritos no canal, que soma apenas 1,88 mil. Por outro lado, o Tocnotícias começou sua atuação no YouTube em 2007 e conta com mais de 2.800 vídeos publicados e 66,7 mil inscritos no canal. Dados que mostram uma atuação mais frequente na plataforma, com uma média de 178 vídeos por ano. Porém, nas duas semanas de coleta de dados, o veículo não publicou vídeos, o que demonstra que não há padronização das postagens.

Por conta de uma quantidade de conteúdo razoável na plataforma e pela história construída ao longo dos anos com a publicação de vídeos (Silva & Rocha, 2023), o canal foi o único que aumentou o número de seguidores durante o período analisado, saindo de 66,4 para 66,7 mil seguidores. Voz do Bico e Folha do Bico permaneceram com 1,81 mil e 1,88 mil seguidores, respectivamente. Isso ilustra o que Jurno & D’Andréa (2020) e Van Dijck et al. (2018) falam de uma atuação algorítmica desconhecida do público e das empresas jornalísticas, pois enquanto o Voz do Bico produziu conteúdo para a plataforma no período analisado, o veículo não teve alterações no número de seguidores. Por outro lado, o Tocnotícias não produziu conteúdo e mesmo assim teve aumento no número de seguidores.

5.2. X (antigoTwitter)

Outra plataforma pouco explorada pelos veículos do Bico do Papagaio é o X. Anteriormente conhecido como Twitter, a plataforma é uma rede social e um serviço de microbloging, que permite aos usuários enviar e receber atualizações pessoais de outros contatos em textos de até 280 caracteres (25 mil para assinantes do X Premium). Durante o período analisado, apenas o veículo Voz do Bico fez publicações no microblog. Os dados (Quadro 2) mostram que os três veículos têm uma publicação na rede, porém há poucos seguidores e interações nas postagens. Uma possível explicação é a pouca utilização desta rede social na região conforme experiência e vivência do próprio pesquisador.

Durante as duas semanas analisadas, o Voz do Bico fez 47 publicações, todas de notícias publicadas no site. Apesar da atualização diária na rede social, não foram verificadas interações nas postagens, que se caracterizam apenas com título da notícia, link e foto. Assim como no YouTube, não há uma prática de atualização da rede com características próprias da plataforma. Esta é usada apenas para difundir as notícias publicadas no site.

Conforme Zago & Silva (2014), os conteúdos recirculam nas redes a partir das apropriações (curtidas, comentários, compartilhamentos), porém isso ocorre quando a emoção, estrutura dos ambientes e a personalização impactam os consumidores. Por não verificar essas apropriações ou reações dos usuários com os conteúdos produzidos pelo Voz do Bico no X, percebe-se a falta desta estratégia e de adequações dos conteúdos às linguagens da plataforma e personalização para o público. Este fato resultou em posts que nem sequer tiveram curtidas ou compartilhamentos. Além disso, nas duas semanas de análise, os números de seguidores também não sofreram alterações, o que pode ser reflexo da falta de estratégia na utilização da plataforma.

Quando 2

Resumo das informações dos veículos biquenses no Twitter

15 a 21 / 01 / 2024

22 a 28 / 01 / 2024

Veículo

Folha do Bico

Voz do Bico

Tocnotícias

Folha do Bico

Voz do Bico

Tocnotícias

Publicações

54,4 mil

18,9 mil

25,2 mil

54,4 mil

18,9 mil

25,2 mil

Seguidores

1.462

1.079

1.130

1.459

1.077

1.130

Publicações na semana

0

21

0

0

26

0

Fonte. Elaborado pelos autores, 2024.

5.3. Instagram

O Instagram é uma plataforma de rede social on-line de compartilhamento de fotos e vídeos curtos entre seus usuários. O conteúdo produzido tem como marca a aplicação de filtros digitais e pode ser compartilhado em várias outras redes sociais. Esta é a plataforma mais utilizada pelos veículos biquenses por ser uma das mais utilizadas na região. É usada para distribuição das notícias publicadas no site com o objetivo de alcançar mais visibilidade, além de estratégias de exploração da rede com conteúdos aleatórios e não relacionados à produção noticiosa.

De forma geral, foi possível observar que os veículos têm uma produção considerável de conteúdos para esta plataforma (Quadro 3). Entretanto, diferente das demais redes em que não há uma estratégia para as publicações, no Instagram, há uma maior atenção com os posts produzidos. Assim, foi possível verificar os cards feitos exclusivamente para o feed ou story, além de post produzidos para esta plataforma sem ligação com as publicações feitas no site.

Quando 3

Resumo das informações dos veículos biquenses no Instagram

Datas

15 a 21 / 01 / 2024

22 a 28 / 01 / 2024

Veículos

Folha do Bico

Voz do Bico

Tocnotícias

Folha do Bico

Voz do Bico

Tocnotícias

Seguidores

20,9 mil

4.334

18,2 mil

20,9 mil

4.374

18,2 mil

Publicações já feitas no feed

879

974

7.831

879

976

7.856

Publicações feitas nas semanas analisadas

0

2

7

0

0

18

Stories

1

25

86

-

-

-

Fonte. Elaborado pelos autores, 2024.

O Folha do Bico foi o que menos utilizou o Instagram no período analisado, realizando apenas uma postagem no feed no dia 15 de janeiro. A última publicação[1] no feed foi no dia 9 de janeiro de 2024. Porém, em uma análise exploratória do feed (Figura 2) do veículo na rede social foi possível verificar que o noticioso tem um padrão nas publicações com cards feitos exclusivos para a rede social, assim como texto das notícias e uso de hashtags nas publicações.

Figura 2

Feed no Instagram do Folha do Bico

Fonte. Captura de tela em 28/01/24.

Também foi possível notar que há curtidas e comentários nas postagens, principalmente quando se tratam de notícias sobre o Bico do Papagaio ou da política local. O veículo também explora a ferramenta reels da plataforma, que permite a publicação de vídeos mais longos. Há um foco também de sempre destacar nas postagens a localização onde aconteceu o fato noticiado. Informação que é destacada sempre no chapéu/retranca do card.

O Voz do Bico também tem uma padronização nas publicações feitas no Instagram, o que demonstra uma certa atenção do veículo com esta plataforma (Figura 3). Esta que é usada exclusivamente para divulgar as notícias postadas no site, seja com cards no feed ou stories com link que direciona o internauta para o website. Não há publicações de reels e posts exclusivos para rede além da divulgação de notícias ou publicações que incentivem a interação com o público.

Figura 3

Feed do Instagram do Voz do Bico

Fonte. Captura de tela feita em 28/01/2024.

Durante as duas semanas analisadas, também foi verificado que o Voz do Bico tem uma estratégia no uso do Instagram com quesitos para publicações no feed e nos stories, pois foram publicadas 140 notícias no website nas duas semanas, mas foram feitas apenas duas postagens no feed. Por outro lado, as notícias locais ou estaduais foram todas publicadas nos stories, que tem como padrão a publicação de um print da versão mobile do site com link que direciona o internauta para a notícia no website. Mas não foi possível identificar os critérios ou estratégias do veículo no uso da plataforma, o que pode ser feito em pesquisa qualitativa posteriormente.

Dos três veículos jornalísticos analisados, o Tocnoticias é o que mais se diferencia por ter uma estratégia de uso do Instagram, que mescla publicações de notícias e situações locais no feed. Já os stories são utilizados para publicações de publicidades e vídeos virais ou memes. Não foi verificada no período analisado a divulgação de notícias nos stories. Além disso, há uma padronização para publicações de notícias no feed (Figura 4), porém as demais publicações são feitas aleatoriamente.

Figura 4

Feed do Tocnoticias no Instagram

Fonte. Captura de tela feita em 28/01/2024.

Vale destacar que o Tocnoticias foi o único dos três veículos analisados que usa as plataformas de redes sociais digitais para publicidade (Figura 5). Isso foi verificado nos stories do Instagram e do Facebook. São anúncios de empresas locais, como supermercados, lojas de informática, lojas de departamento, bares e restaurantes. Além disso, os stories são usados para publicar vídeos virais e memes, o que atrai audiências. Foram identificadas também situações locais, como pedidos de ajudas, rifas e denúncias.

Figura 5

Stories publicados pelo Tocnoticias

Fonte. Captura de tela feita em 28/01/2024.

Quanto ao uso do Instagram pelos webjonais do Bico do Papagaio, foi possível notar que os três veículos analisados (Folha do Bico, Voz do Bico e Tocnoticias) têm poucas estratégias para uso dessa plataforma, que é usada principalmente para divulgar as notícias produzidas para os websites. Os três adotam práticas semelhantes de publicações no feed com posts padronizados. Por outro lado, os stories são diversificados em um e padronizado em outro.

O Tocnoticias é o que se destaca, pois apresenta publicações específicas, mesmo que não jornalísticas, para as redes sociais. Além disso, o veículo utiliza os stories do Instagram e Facebook para a prática de publicidade. Esse fato indica novas formas de sustentabilidade dos veículos locais, que é usar, além dos sites, as plataformas de redes sociais dos veículos para publicidade. O veículo também é o único que adota a publicação de memes e vídeos virais em suas redes. Contudo, se por um lado atende ao requisito de atualização contínua que as redes sociais digitais pedem, por outro lado pode desvirtuar a credibilidade do veículo ao fazer este tipo de publicação que não se alinha à prática noticiosa de um veículo jornalístico.

5.4. Facebook

O Facebook é uma plataforma de rede social que permite a atualização em fotos, textos, vídeos, stories, transmissões ao vivo, formação de grupos, entre outros recursos. Apesar da plataforma ter perdido espaço nos últimos anos[2], no Bico do Papagaio ela continua sendo utilizada com frequência pelos veículos noticiosos. Durante as duas semanas analisadas, apenas o Folha do Bico não realizou postagens na rede. Voz do Bico e Tocnoticias realizaram, respectivamente, 51 e 17 postagens (Quadro 4). O website de Tocantinópolis também explora muito a ferramenta de story, que é usada para divulgação de publicidades e memes, além de situações diárias vivenciadas pelo dono do veículo ou de repercussão na cidade.

Quadro 4

Resumo das informações dos veículos biquenses no Facebook

Datas

15 a 21 / 01 / 2024

22 a 28 / 01 / 2024

Veículos

Folha do Bico

Voz do Bico

Tocnotícias

Folha do Bico

Voz do Bico

Tocnotícias

Curtidas na página

35 mil

14 mil

20 mil

35 mil

14 mil

20 mil

Seguidores na página

37 mil

16 mil

37 mil

37 mil

16 mil

37 mil

Publicações nas semanas analisadas

0

28

3

0

23

14

Fonte. Elaborado pelos autores, 2024.

A partir dos dados analisados, foi possível verificar que os veículos não têm uma estratégia de utilização da plataforma com uma linguagem e recursos pensados conforme a gramática do Facebook, que preza por conteúdos com fotos ou vídeos e textos que estimulem usuários ativos no momento a comentar, reagir ou compartilhar o material na rede. As postagens (Figura 6) são apenas de link, foto e lide da notícia.

Figura 6

Resumo das informações dos veículos biquenses no Facebook

Fonte. Captura de tela feita em 28/01/2024.

Dos três veículos analisados, apenas o Tocnoticias explora a ferramenta de story da plataforma. Porém, não foram verificadas, nas semanas analisadas, publicações de notícias nesta ferramenta. O noticioso aproveitou para publicar publicidades, memes, pedidos de ajuda e vídeos virais. Com relação ao Folha do Bico, nas duas semanas de análise, não houve publicações nesta plataforma. Porém, em análise exploratória da página, foi possível verificar que há uma padronização das postagens, semelhante ao Voz do Bico, mas é divulgado apenas o link da notícia publicada no site com a foto. O que sugere que há uma publicação automática das notícias divulgadas no site, pois há recursos das plataformas de gerenciamento de conteúdo que permitem essa publicação.

No geral, nota-se que os três veículos usam o feed do Facebook apenas para divulgação das notícias publicadas no site, semelhante ao que ocorre na plataforma do Instagram. O resultado dessa prática são poucas interações nas postagens, que contam com poucas reações, compartilhamentos ou comentários. O caso que se destaca é o Tocnotícias, que publica além de notícias, outras situações do dia a dia de Tocantinópolis ou mesmo da vivência do dono do veículo. Essas são as postagens com maior engajamento (Figura 7) e são repetições das mesmas publicações feitas no Instagram.

Enquanto a maioria das postagens de notícias do site não teve engajamento, nem mesmo uma curtida, as postagens da Figura 7 foram as mais engajadas no período analisado, contando o maior número de comentários, reações e compartilhamentos. Outro ponto que chamou atenção foi o caso do professor hospitalizado, que teve grande repercussão nas postagens (Facebook e Instagram), mas não virou notícia no site, contando a situação e ouvindo as autoridades envolvidas. Além de perder um assunto que poderia repercutir e gerar muitos acessos, o veículo deixou de cumprir funções básicas do jornalismo, como apurar e noticiar situações que envolvem e atingem diretamente a população da cidade ou região onde o veículo se encontra.

Figura 7

Postagens feitas pelo Tocnotícias no Facebook

Fonte. Captura de tela feita em 21/01/2024.

6. Considerações finais

Buscamos neste estudo descrever e caracterizar o uso de plataformas digitais por veículos jornalísticos locais na região do Bico do Papagaio. Ao longo da pesquisa, foi evidente que os veículos analisados usam as plataformas para disseminação de conteúdo jornalístico nos perfis no Facebook, YouTube, Instagram e Twitter, sendo uma estratégia de levar o público dessas redes sociais para acessar os conteúdos publicados nos sites.

Foi possível verificar que os principais veículos jornalísticos da microrregião, Voz do Bico, Tocnotícias e Folha do Bico, utilizam essas plataformas de maneira unidirecional. Ao invés de se tornar uma ferramenta estratégica para a construção de uma presença mais robusta e interativa, limita-se à simples divulgação dos materiais jornalísticos postados em seus websites. A falta de estratégias direcionadas para interação, engajamento e aproveitamento integral das potencialidades das plataformas revela uma oportunidade desperdiçada para fortalecer os laços com a audiência e expandir a visibilidade desses veículos.

A falta de estratégia também resulta em uma comunicação genérica e sem foco no público-alvo de cada rede social. Mesmo as plataformas oferecendo recursos gratuitos para a análise de dados e consequente segmentação de público, estes são pouco utilizados ou ignorados. Isso nos leva registrar que os veículos precisam investir em recursos humanos para operacionalizar esses processos ou capacitar profissionais que desenvolvam estratégias eficazes, a fim de utilizar as ferramentas disponíveis em cada plataforma. Existe ainda a possibilidade de explorar formatos interativos para aumentar o engajamento com o público.

Por fim, destaca-se que a presença nas plataformas digitais dos veículos jornalísticos locais é fundamental para a sua sobrevivência no cenário atual. No entanto, é necessário ir além da mera reprodução do conteúdo do website nas plataformas digitais. A criação de estratégias personalizadas, a utilização das ferramentas disponíveis e a busca por modelos inovadores são essenciais para o sucesso da comunicação digital, mas, a partir da nossa análise, ainda estão distantes do contexto das regiões mais remotas do Brasil.

É importante destacar que, apesar dos resultados obtidos, o presente estudo apresenta limitações que devem ser consideradas ao interpretar os achados. Uma das principais limitações reside na ausência de entrevistas diretas com os jornalistas responsáveis pelos veículos analisados para entender as razões por trás das estratégias adotadas, ou a falta delas. Mas destacamos a importância deste estudo para fornecer elementos substanciais para uma pesquisa futura que realizará uma entrevista em profundidade com os responsáveis pelos noticiosos para discutir as estratégias adotadas pelos noticiosos.

Declaração sobre a contribuição específica de cada um dos autores (Taxonomía Credit)

Esboço biográfico dos autores

Alan Milhomem da Silva é professor do curso de Jornalismo da Universidade Federal do Amapá́ (Unifap). Doutorando em Jornalismo na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Mestre em Comunicação e Sociedade pela Universidade Federal do Tocantins (UFT). Bacharel em Comunicação Social/Jornalismo pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA/Campus Imperatriz). Pesquisador do Grupo de Pesquisa em Jornalismo e Multimídia (CNP/UFT). Pesquisa temáticas relacionadas ao jornalismo regional e local, ciberjornalismo, telejornalismo, redes sociais digitais e cultura digital.

Liana Vidigal Rocha é docente do Programa de Pós-graduação em Comunicação e Sociedade e do curso de Jornalismo da Universidade Federal do Tocantins (UFT). Doutora e mestre em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo (USP). Líder do Grupo de Pesquisa em Jornalismo e Multimídia (CNPq/UFT). Pesquisa temas como Ciberjornalismo, Jornalismo Regional, Narrativas Jornalísticas, Mídias Sociais e Contexto Amazônico. Coordena o projeto Narrativa e acontecimentos midiáticos: desafios metodológicos para apreensão das experiências glocais amazônicas (Procad-AM) financiado pela Capes.

Referências

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[1] O último dia de análise do perfil do veículo para a construção deste trabalho foi no dia 28 de janeiro de 2024, às 22h30.

[2] Apesar de pouco mais de 109 milhões de brasileiros conectados ao Facebook, esse dado do início de 2023 é menor que o registrado em 2022. Em 2018, por exemplo, o próprio Facebook relatou ter 127 milhões de usuários brasileiros. Entre 2022 e 2023, o alcance potencial dos anúncios no Facebook caiu 7 milhões de pessoas no Brasil, conforme a própria Meta. Disponível em: https://encurtador.com.br/jluzN. Acesso em: 28 jan. 2024.